Carolina abaixou-se para pegar um papel que repousava no chão junto à porta. Era um aviso de chegada de correspondência endereçado a João, seu marido. Ele devia comparecer à unidade postal do bairro para receber a carta, encomenda ou o que fosse aquilo. Carolina varreu o aviso com os olhos minuciosamente, de ambos os lados, à busca do remetente da misteriosa correspondência. Nada! Apenas o carimbo do correio, a data limite para retirada e o endereço da unidade postal. Telefonou para o trabalho do marido:
- João, meu amor, tudo bem?
- Tudo bem. Aconteceu alguma coisa? – perguntou João.
- Não. É que chegou um aviso do correio dizendo que tem uma carta pra você, mas você tem que ir lá buscar.
- Mas porquê?
- Não sei. O aviso só diz isso.
- Quem foi que mandou a carta?
- Também não sei.
- Como assim tem uma coisa lá, que não sabemos o que é nem quem enviou?!
- Mas é exatamente isso, meu amor. Não é estranho?
- Sim, sim. Mas não se preocupe. Mais tarde, quando eu chegar do trabalho, nós resolveremos isso.
À noite, ao chegar em casa, sentado à mesa, lia e relia João aquele enigmático pedaço de papel. Vasculhava a mente em busca de uma possível origem daquela encomenda repentina. Lembrou-se até de um irmão de sua mãe, desaparecido há mais de trinta anos, tido por todos como morto. “Pode ser ele. Quem sabe? Vai que ele está rico em alguma ilha paradisíaca e agora envia-me um presente para mostrar sua boa vontade.”, elucubrava João. Cogitou também o perigo de uma carta anônima ao recordar um caso que tivera há anos atrás na empresa onde trabalhava. Fora seu único relacionamento extra-conjugal, terminado há tempos. Mas porque uma mulher, igualmente casada, com quem não se envolvia há anos, enviaria uma carta revelando tudo? Hipótese descartada. “Talvez seja Carolina que esteja me traindo. Vai saber”, pensou.
Carolina estava no fogão, finalizando os preparativos para o jantar, não deixando contudo de observar a inquietação de João às voltas com o papel. Ela também estava muito inquieta com todo aquele mistério. “Custava colocar o nome do remetente no aviso? Bastava uma linha para evitar este suplício”, revoltava-se. Temia por umas fotos um tanto ousadas que um ex-namorado excêntrico batera dela na flor da juventude, pouco antes de conhecer João, que nunca soubera disso. Alguém poderia tê-las achado e resolvido fazer uma brincadeira de mal gosto. “Eu não saberei onde enfiar a cara se isto acontecesse!”, desesperava-se.
- Mas como eu vou fazer para buscar essa carta? – perguntou João.
- Acho que terei de ir eu, já que o correio só funciona no horário em que você está trabalhando. – propôs Carolina, tentando disfarçar a ansiedade de ver logo sua proposta aceita. Caso fossem mesmo as fotos comprometedoras, poderia se livrar delas sem maiores problemas.
- Eu não acho que você possa receber por mim. Veja, o aviso está no meu nome. – respondeu ressabiado João, desconfiando de algum ardil da esposa.
- Então como você vai fazer?
- Eu não sei... Bom, o jeito é você ir lá e tentar. – entregou-se João, dando-se por vencido, para felicidade da esposa.
No dia seguinte, João contou o estranho caso a Marcelo, companheiro de trabalho há anos, que afirmou não conhecer esta modalidade de entrega do correio, que não informava ao destinatário do que se tratava a encomenda tampouco quem a enviou. Achou tudo isso muito estranho e perguntou-lhe se não tinha idéia de onde poderia ter vindo aquela carta. Ouvindo a negativa de João, sobressaltou-se Marcelo, por haver diversas vezes cortejado Carolina, sem que esta houvesse dado trela a suas iniciativas. Como era o fato de conhecimento de todos no setor, visto que a fofoca se espalha mais no vento que a poeira, temeu que uma carta anônima pudesse pôr fim àquela amizade de muitos anos, que nem sua cobiça desenfreada conseguira destruir.
Marcelo passou então a persuadir João a não ir buscar tal carta, dizendo que nunca ouvira falar de uma boa notícia que chegasse daquela forma, mas que somente as grandes desgraças exigem rufo de tambor e som de trombeta para se fazerem conhecidas. “Às vezes é melhor nem saber de certas coisas para se continuar a vida com paz e tranquilidade.”, dizia Marcelo. Vendo aquela mudança súbita de comportamente no amigo, ficou João desconfiado. Resolveu então fingir aceitar o conselho recebido e, para dar verossimilhança à sua encenação, pegou o telefone, fingiu discar para casa e ordenar a Carolina que não fosse ao correio buscar a tal carta. Marcelo sentiu-se muito aliviado e disse que o amigo havia tomado a melhor das decisões.
Tendo João se ausentado por alguns instantes, aproveitou o colega traidor para telefonar à esposa deste, para avisá-la do grande risco de que os havia livrado. Como João voltou rapidamente, Marcelo foi obrigado a desligar sem dar maiores explicações, deixando em grande interrogação os pensamentos da moça, que resolveu ligar para o marido, perguntando inocentemente porque não devia ela buscar a correspondência. João ligou os fatos e concluiu que havia uma misteriosa ligação entre Marcelo e sua esposa. Irado, ordenou que ela viesse até a empresa imediatamente. Quando esta chegou, ordenou, quase fora de si, que Marcelo os acompanhasse.
Estando os três no carro a caminho do correio, exigiu João, aos berros, que fosse despida a verdade sem demoras nem rodeios, antes de ser aberta a carta fatal, quando seria tarde demais.
- Anda, mulher! – gritava João – Fala logo!
- Eu não tenho motivos para ser acusada de nada, – retrucou Carolina – mas sim esse teu amigo da onça, que andou me cortejando, o que já é de conhecimento de todo o teu setor. Se não te contei, foi para poupar-te da dor da traição desse Judas!
- Isso é verdade, metecapto? – perguntou João, voltando-se para o ex-amigo.
- É verdade. – respondeu Marcelo - Senti-me capturado pela beleza da tua esposa e tentei conquistá-la, mas saiba que tua mulher é a mulher mais honrada que já conheci.
- Então conta-me – disse João - porque não durmiste durante toda a noite passada, mulher! Pensas que não vi quantas vezes levantaste durante a madrugada? Estavas muito aflita.
- Muito me envergonha o que te contarei, marido, ainda mais na presença deste verme que nos ouve. – esbravejou Carolina – Mas contarei a verdade por não suportar mais tanto medo de que seja ela descoberta. Sim, estava aflita e desesperada de que descobrisses que fui fotografada como vim ao mundo por um namorado excêntrico que tive antes de conhecer-te. Temo que esta carta sejam as malditas fotos.
- Mulher vadia! Fazia-te de santa comigo e até as lentes das câmeras conheciam tua nudez!
- Porque acusas tua mulher de desonesta – interrompeu Marcelo – se ela não traiu tua confiança em momento algum, já que nem te conhecia? Mas tu sim, traíste-lhe com a Sílvia, lembro-me muito bem. Agora queres posar de justo, seu grande hipócrita!
- É verdade. – reconheceu João, baixando a voz – não posso negar tal fato. E foi por achar que a carta se refiria a este caso que insone pude observar que Carolina também não dormia.
- Seu infeliz, – gritou Carolina às lagrimas – Como ousas me acusar sendo ainda mais culpado?
Chegaram ao correio com as faces afogueadas, como que carregando uma negra nuvem de tensão sobre as cabeças. João entregou o papel ao atendente, que entrou para buscar a correspondência. Neste ínterim, entreolhavam-se João, Carolina e Marcelo, num misto de ódio, culpa e remorso. Quem os observasse não distinguiria culpado de inocente. Voltou o atendente com um envelope branco na mão. Nenhum deles dava mais atenção ao conteúdo da carta, quando João a leu. Ela dizia:
“Caro eleitor,
em virtude das acusações de campanhas milionárias que receberam diversos candidatos, nosso partido decidiu que as correspondências que enviamos serão pagas por aqueles que as recebem. Sendo assim, viemos por meio desta pedir seu voto para o candidato J..., número X, que promete lutar pela educação, saúde e emprego para todos.
Atenciosamente,
Partido....”
dezembro
-
na praia
menstruada
quarto dia tem um momento em que tudo
Vaza
último suspiro
depois do terceiro, um hiato
parece que terminou
Dessa vez
menos tempo, m...
Há 11 meses
7 comentários:
eu disse, demoro, mas leio...risos... cara, gostei da trama, ficou bem interessante, demonstra bem como a culpa, o peso na consciência, nos impele à uma auto-condenação de pronto antes mesmo de qualquer veredicto.
=)
essa cabecinha fértil, sei não, sei não... ;)
hehehehe...o q esses 'russos boladão' fizeram com vc...
Puuuutz!
no coments...
muito show.
Como eh bom não se tornar prisioneiro da liberdade!: )
sempre tenho que ler o que o Fjunior escreve no minimo duas vezes, mas sempre vale a pena hehehehe.Depois q eu entendo a mensagem flui.
Paz menino.
cara as mensagens que os contos nos passa são refletivas. mas cá entre nós, convenhamos, os texto são enormes. nem todos tem a santa paciencia de le-los..hehehe nos mais está ótimo. abraços ¬¬
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